Todos nós estamos mais predispostos ou aptos a divulgar e a publicitar informações ou factos que nos tragam, de algum modo, certos benefícios, sejam de ordem económica ou pessoal. O mesmo já assim não sucede se dessa divulgação puder resultar algum prejuízo para a nossa atividade ou bem-estar.
Com as instituições bancárias, o princípio é o mesmo.
Por duas razões: a politicamente correta e a real.
A primeira fundamenta-se na necessidade de prossecução do interesse público no bom funcionamento da economia, evitando-se qualquer ato suscetível de afetar a confiança depositada pela sociedade nestas instituições, a qual é vital para a estabilidade do sector bancário e, inerentemente, do sistema financeiro em geral. Na realidade, se considerarmos o atual modelo de Banca Universal, é sabido que a instabilidade desta necessariamente se repercutirá noutros sectores, cujo equilíbrio e solidez são igualmente condições fundamentais para o bom funcionamento do sistema financeiro em geral.
A razão real para que as instituições bancárias procedam a uma divulgação discreta de certos serviços pode provir da conveniência na não adesão em massa a esses serviços, pois poderia ocasionar um impacto negativo nos lucros da sua atividade.
A verdade é que, quando assim é, a instituição bancária, obrigada a proceder a essa divulgação[1], fá-lo de forma comedida e circunspecta. Divulga, mas não publicita. Sem grande exuberância ou prolixidade.
É o que sucede com as contas de serviços mínimos bancários.
Não obstante o modelo oficial de divulgação de serviços mínimos bancários, previstos no Aviso do Banco de Portugal n.º 2/2015[2], onde se impõe que as instituições de crédito divulguem de forma pública e permanente nos seus balcões e sites toda a informação sobre os serviços mínimos bancários, e que afixem em lugar visível em todos os seus balcões e locais de atendimento ao público, um cartaz em formato A4 onde se prestem todas as informações e condições relativas aos serviços mínimos bancários, quantos de nós já tomou conhecimento destes serviços através das instituições financeiras?
Os ditos cartazes estão afixados. Mas o que o aviso de Banco de Portugal não determina é o local onde devem os mesmos ser afixados, pelo que poderá ser em qualquer zona da agência bancária ou do local de atendimento e existem tantas, umas mais visíveis que outras.
Mas em que consistem afinal os Serviços Mínimos Bancários?
O seu regime legal aparece-nos consagrado no Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março, tendo sido já alterado pela Lei n.º 19/2011, de 20 de Maio, pelo Decreto-Lei n.º 225/2012, de 17 de Outubro e, mais recentemente pela Lei n.º 66/2015, de 6 de Julho, cuja entrada em vigor ocorreu em 4 de Outubro de 2015.
Na realidade, foi este último diploma que veio consagrar a obrigatoriedade de as instituições de crédito que prestem ao público os serviços incluídos nos serviços mínimos bancários – sejam bancos, caixas económicas, caixa central e caixas de crédito agrícola mútuo – disponibilizarem os serviços mínimos bancários.
Até à Lei n.º 66/2015, a prestação destes serviços era voluntária e dependia se a instituição queria aderir a estes serviços ou não, embora a maior parte dos bancos portugueses tivessem aderido voluntariamente.
Já dizia o preâmbulo do diploma legal que criou os serviços mínimos bancários que a atividade financeira e bancária assume uma relevância dominante na organização económica e social das famílias e que a “indisponibilidade de certos serviços financeiros e bancários, além de óbice ao rápido acesso ou mesmo entrave à obtenção de bens e serviços, muitas vezes de carácter essencial, é suscetível de consubstanciar fator de exclusão ou estigmatização social”. Dessa forma, para evitar a dificuldade no acesso a certos serviços por parte de certos particulares o Estado criou os serviços mínimos bancários.
Os serviços mínimos incluem a abertura e a manutenção da sua conta de depósito à ordem, um cartão de débito para movimentação da conta, acesso à movimentação da conta de serviços mínimos bancários através de caixas automáticos, serviço de homebanking e balcões da instituição de crédito, realização de depósitos, levantamentos, pagamentos de bens e serviços, débitos diretos e transferências intrabancárias nacionais, sem restrição quanto ao número de operações que podem ser realizadas[3].
Mediante a reunião de certos requisitos, qualquer pessoa poderá proceder à abertura de uma conta de serviços mínimos bancários, que consiste numa conta de depósito à ordem, ou então solicitar a conversão da sua atual conta de depósito à ordem numa conta de serviços mínimos bancários, sem que por essa conversão o banco possa cobrar qualquer comissão, custo ou encargo[4].
Os requisitos para se obter uma conta de serviços mínimos são cumulativos e requer que o candidato não seja titular de nenhuma outra conta de depósito à ordem, seja no banco onde requer a abertura ou a conversão de conta ou em qualquer outro banco e autorizar o banco a proceder à confirmação da veracidade desta informação após consulta junto das entidades gestoras dos sistemas de funcionamento dos cartões de crédito e débito.
É totalmente vedada a possibilidade de as instituições de crédito condicionar a conversão ou a abertura de uma conta de serviços mínimos à assinatura de documentos, impressos ou comprovativos adicionais àqueles que são necessários para a abertura de uma conta de depósito à ordem, ou à aquisição de produtos ou serviços adicionais.
A conta de serviços mínimos bancários pode ser titulada por uma ou por várias pessoas singulares, desde que todos os titulares reúnam os requisitos de abertura supra descritos, exceção feita se um dos contitulares da conta de serviços mínimos bancários for uma pessoa singular com mais de 65 anos ou dependente de terceiros, considerando-se dependente de terceiros aquele que apresente um grau de invalidez permanente, devidamente comprovado pela entidade competente, igual ou superior a 60 %[5].
A principal vantagem da conta de serviços mínimos bancários está no limite máximo possível que pode ser cobrado pelas instituições de crédito pela prestação de tais serviços.
Assim, não podem ser cobradas “comissões, despesas ou outros encargos que, anualmente, e no seu conjunto, representem valor superior ao equivalente a 1 % da remuneração mínima mensal garantida”, ou seja, não poderá ser cobrada qualquer despesa acima de 5,30 euros por ano. Além disso, é ainda fornecido um cartão de débito a cada titular o cujo custo e anuidade já está incluída naquele montante, sendo cobrada a emissão de cartão de débito apenas se o titular da conta solicite a substituição do cartão de débito antes de decorridos 18 meses sobre a data da respetiva emissão, exceto se a validade for inferior a este prazo ou, então, a causa de substituição seja imputável à instituição de crédito, conforme dispõe o art. 3.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março.
As instituições de crédito só poderão resolver o contrato de abertura de conta de serviços mínimos se se constatar que o titular da conta de serviços mínimos bancários deixou de reunir os requisitos de acesso aos serviços mínimos bancários ou se, um ano após a abertura ou conversão de conta de depósito à ordem em conta de serviços mínimos bancários, a mesma apresentar um saldo médio inferior a 5% da remuneração mínima mensal garantida, ou seja, inferior a 26,50 euros e não tiver sido realizada, nos seis meses, qualquer operação bancária.
De referir ainda que, segundo dados revelados pelo Banco de Portugal, em 31 de dezembro de 2015 existiam 24.068 contas de serviços mínimos o que, comparativamente com o final do ano de 2014, representa um aumento de 73%.
Atualmente, encontra-se na discussão na especialidade[6] uma proposta de lei da autoria do PCP[7], tendo sido discutida na generalidade e aprovada a 8 de Janeiro deste ano[8], que visa a criação e disponibilização de “contas-base” aos clientes bancárias onde nenhuma despesa, comissão ou custo pode ser cobrado, sendo totalmente gratuitas.
Cremos que estas contas, face ao regime legal atual vigente sobre os serviços mínimos bancários e acima explicitado, não acrescentam nenhuma novidade significativa, considerando que o desígnio prosseguido por ambos os tipos de conta é o mesmo.
A única diferença substancial residirá na gratuitidade das “contas-base” face às contas de serviços mínimos que, como se viu, são tendencialmente gratuitas.
Se o impacto de acesso em massa às contas de serviços mínimos traz preocupações à atividade das instituições de crédito, a adesão às “contas-base” pode configurar um pesadelo.
Crê-se que as contas de serviços mínimos divulgadas de forma conveniente servem o propósito que as “contas-base” visam, pelo que estas poderão apenas configurar um ideal populista que nada acrescenta de relevante e poderá apenas servir de “isco para pesca mais distraída ou menos avisada”.
Cremos ainda, e por último, que além da insistência na divulgação eficaz das contas de serviços mínimos, se deveria fazer, e à medida que a adesão às mesmas fosse evoluindo, um estudo de impacto destas na atividade das instituições que as fornecem.
- [1] Art. 7.º- A, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março.
- [2] Alterou o Aviso do Banco de Portugal n.º 15/2012 e deve ser complementado com a Instrução n.º 15/2015.
- [3] Cfr. Art. 2.º, n.º 2, al. a) do Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março.
- [4] Cfr. Art. 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março.
- [5] Cfr. Art. 4.º-B, n.º 1, 3 e 4 do Decreto-Lei n.º 27-C/2000 de 10 de Março.
- [6] Na comissão competente que é a Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa.
- [7] Cfr. Projeto de Lei 92/XIII,
- [8] Votação na Reunião Plenária n.º 23, com os votos a favor do PCP, BE, PAN, PEV e PS, e votos contra do PSD e CDS-PP.
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