As relações laborais assentam numa posição de desigualdade, no sentido de que existe uma parte mais forte, o empregador, que exerce determinados poderes sobre o trabalhador, que se assume como a parte mais “desprotegida”. Assim sendo, para que o empregador não utilize o seu poder de forma abusiva, torna-se necessária uma especial defesa dos direitos fundamentais do trabalhador, em especial da sua personalidade.
O poder de controlo pelo empregador é, portanto, inerente à própria relação laboral, embora tenha os seus próprios limites. Sendo esses respeitados, a legislação portuguesa admite um controlo presencial por parte do empregador. Para além disso, os meios de vigilância à distância não são totalmente excluídos do poder de controlo do empregador. O que se sucede é que só podem ser utilizados em casos limitados, consagrados no artigo 20.º do Código do Trabalho.
Com o avanço tecnológico, como é sabido, evoluíram de forma significativa as formas pelas quais é permitido ao empregador exercer o seu poder de controlo em relação ao trabalhador. Os meios de vigilância à distância passaram a fazer parte das relações laborais.
Neste sentido, surge a questão de perceber se o GPS pode ser considerado como um desses meios de vigilância à distância.
O conceito de meios de meios de vigilância à distância do artigo 20º do Código do Trabalho é um conceito indeterminado. Contudo, consideramos que, apesar do número 3 do artigo 20.º apenas conter uma remissão direta para a “videovigilância”, não fará sentido cingir o conceito em análise apenas a este grupo de casos. A ratio desta norma apenas conseguirá ser alcançada se no conceito de “meios de vigilância à distância” forem incluídos outros meios que possibilitem o empregador exercer um controlo continuado do trabalhador.
O GPS instalado numa viatura de um trabalhador permite conhecer todo o trajeto percorrido, bem como o seu tempo, paragens efetuadas e a sua duração, velocidade e localização permanente. Assim sendo, permite construir um perfil detalhado sobre os movimentos efetuados, sendo facilmente enquadrável no conceito em análise. O GPS instalado, por exemplo, no relógio de pulso do trabalhador é ainda mais intrusivo, invadindo toda a vida privada do mesmo.
A circunstância de o GPS ser considerado como um “meio de vigilância à distância” apenas permite que o mesmo seja usado em casos limitados, nomeadamente quando razões de segurança e proteção de pessoas e bens ou particulares exigências inerentes à atividade o justifiquem.
O GPS poderá, a título exemplificativo, ser utilizado como meio que possibilite a gestão de frotas do empregador e a melhor assistência externa prestada aos clientes. Todavia, nunca poderá ser utilizado para controlo do desempenho profissional do trabalhador.
Mesmo sendo admissível a utilização do GPS é sempre necessário o cumprimento do princípio da proporcionalidade, nomeadamente, elaboração de um juízo prévio sobre a sua indispensabilidade e sobre a proporcionalidade dos sacrifícios que comporta para os direitos fundamentais do trabalhador. O trabalhador tem também de ser informado sobre a finalidade, duração e a entidade responsável por efetuar o controlo através do GPS.
Em suma: o GPS deve ser considerado como um meio de vigilância à distância. Logo, para que a sua utilização seja admissível, há que encontrar um ponto de equilíbrio entre os interesses de gestão empresarial e os direitos de personalidade do trabalhador.
Joana Fuzeta da Ponte | Advogada-estagiária na Macedo Vitorino & Associados
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