Justiça. O que é?
A maioria dos Juristas ou Advogados já se terá, em algum momento da sua formação ou carreira, questionado sobre o que significa de facto o termo “Justiça”.
Poderíamos aqui optar pelo caminho “fácil” e citar o reputado dicionário Webster, para o qual Justiça significa “a manutenção ou administração do que é justo”. Ou até mesmo recuar milhares de anos atrás e discutir a origem do termo. Mas deixemos os Gregos por agora, e foquemo-nos no muito mais atual presente.
Nos dias de hoje, em que cada vez é mais complicado, e eventualmente arriscado, definir e classificar algo(uém), como sabemos o que constitui justo?
No espaço de duas décadas, os portugueses viram membros de Governo, Clubes desportivos, Empresas cotadas em Bolsa, e até Autarcas investigados e, por vezes, até acusados de crimes, o que, fruto da notoriedade e reconhecimento dos intervenientes, fez capa de jornal e abertura de noticiário semanas sem fim.
Ora tratando-se de, tal como acima referimos, intervenientes com “o seu quê” de notoriedade e importância, logo captou a atenção do país.
Os meios de comunicação social são fundamentais naquilo que, na nossa ótica, constitui uma sociedade moderna compatível com aquilo que é, e tem sido, o século XXI, um século caracterizado e definido pela constante evolução de tecnologia, pelo encurtamento de distâncias e realidades entre culturas, países, cidades, vilas e bairros. Um século em que podemos fazer chegar instantaneamente uma mensagem ao outro lado do Mundo, sem sequer ter de sair do conforto do nosso sofá.
E aqui entra o cerne essencial daquela que consideramos ser a questão. Todos nós que gostamos de desfrutar da ocasional série norte-americana conhecemos a expressão “ser julgado por um júri dos nossos pares”, mas até que ponto esse julgamento ocorre apenas na Sala de Audiências?
Nas imortais palavras de Ben Parker1, “com grande poder, vem grande responsabilidade”.
Recentemente, dois casos em particular fizeram manchetes por todo o país. Aquela que lá fora tem sido uma das grandes bandeiras do país, elevando (ainda) mais alto o nome deste Canto à beira-mar plantado, tem, infelizmente, deixado muito a desejar dentro de portas.
Falamos, claro, do desporto-Rei (a.k.a2 Futebol).
Dois processos em particular correm, ainda, os trâmites legais necessários para a obtenção de Justiça. Em comum? A (des)informação e discussão propagada um pouco por todos os círculos, desde o grupo de amigos ao comentário televisivo.
Um desses casos, aquele cujo desenvolvimento data mais recente, causou revolta e surpresa em diversos quadrantes da nossa sociedade.
Muitos consideram que a “culpa”, em termos leigos, deve ser determinada com base em subsunções lógicas retiradas de premissas incompletas e citações parciais de sentenças3 mas, como ficou recentemente comprovado, o sistema legal exige algo mais do que a “forte presunção de culpabilidade”.
Ecoaram, com especial ênfase, afirmações proferidas relativamente a investigações atribuídas a órgãos de polícia criminal, criticando o raciocínio tipicamente policial, apontado como uma das causas da consequência nefasta que adveio para o nosso sistema judicial.
Tais palavras devem colocar todo e qualquer defensor da Justiça em reflexão profunda, questionando-se onde falhámos para, no final do dia, o raciocínio policial levar à restrição ou obstrução da administração do que é justo.
A nossa Justiça tem dois planos, dois mundos, dois processos. Um, corre os seus termos na Sala de Audiências, regido por regras e princípios desenvolvidos e aperfeiçoados desde a Grécia Antiga (parece que não conseguimos mesmo deixar os Gregos em paz…), e outro, corre os seus termos na televisões, jornais e redes sociais.
Ambos resultam em condenação ou absolvição, ambos geram debate, mas, feitas as contas, somadas as peças e alegações, debates e reportagens, compete a cada um de nós ser o Juiz daquilo que proferimos, criticamos, ofendemos e, acima de tudo o resto, aquilo que contribuímos para que este nosso enorme País, seja um pouco melhor a cada dia.
Não estando aqui colocado em causa se a atuação do “mero Subalterno mandatado” vincula o Patronus4, devemos antes questionar se, certas e determinas vitórias, poderão, de facto, ser consideradas vitórias, ou, ao invés, deverão ser rotuladas como derrotas de um País cada vez mais descrente na própria pedra em que foi esculpido.
Cabe-nos a nós, enquanto signatários tácitos do Contrato Social, colocar os pratos na balança e julgar.
Por agora, parece simplesmente que a Balança5 se partiu nas mãos dos Portugueses, com todas as consequências que daí poderão advir.
Bernardo Gomes da Conceição | Advogado Estagiário na Antas da Cunha Ecija & Associados
1 Nome de personagem da saga Homem-Aranha (Marvel Comics)
2 “Also known as”
3 Diversos meios de comunicação constituem-se como Assistente em Processo Penal, invocando interesse público no processo.
4 Origem (proveniente do latim) da palavra Patrão, não uma referência ao feitiço para afastar Dementors.
5 Símbolo de Justiça
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