O processo de transformação digital está em curso, sendo vulgarmente chamada de “quarta revolução industrial”. Conceitos como Internet das Coisas (IoT – Internet of Things), nuvem, big data, realidade aumentada, blockchain ou inteligência artificial são apenas algumas das tecnologias digitais que estão por um lado a transformar as organizações produtivas, bem como a forma como olhamos para o trabalho. O processo de transformação digital (e que deverá acelerar nos próximos anos) constitui uma realidade incontornável atenta a estrutura do mercado cada vez mais global e competitivo, sendo que até 2021 é expectável que pelo menos 30% da economia nacional já esteja digitalizada.
Nestes termos, é inegável que a transformação digital é um processo disruptivo imparável que exige rápidas mudanças nos modelos de negócio e cultura organizacional das empresas, pois a sorte de quem não abraçar estas mudanças pode vir a ser o seu desaparecimento (a curto-médio prazo) atenta a concorrência de outras empresas que se transformaram e que atuam no mesmo sector de mercado, seguindo o princípio base da sobrevivência segundo a lei do mais forte.
Relativamente ao impacto que a transformação digital pode vir a ter nas relações laborais prevê-se que venha permitir a utilização de capital humano para funções com maior valor acrescentado e atividades mais especializadas. Contudo, o aumento da digitalização dos processos produtivos pode ter como efeitos a subida generalizada de desemprego, bem como levar a uma alteração do tipo e perfil de emprego.
Em resultado das mudanças operadas pela transformação digital espera-se que mais de metade dos trabalhos que hoje existem mudem drasticamente, ou que simplesmente desapareçam, conforme previsões divulgadas num estudo recentemente publicado sobre o futuro do trabalho pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Para contornar este problema, Portugal terá de ter a capacidade de criar, preencher e manter empregos altamente qualificados, implicando para esse efeito melhorar o vínculo entre as instituições de ensino e empregadores de forma a diminuir o gap estrutural que se verifica nos dias de hoje.
Por outro lado, uma das faces mais visíveis desta transformação tecnológica é a expansão das designadas economia das plataformas, centrada numa filosofia de trabalho colaborativa que enquadra profissionais que desempenham a sua atividade online (tal como a Uber, ou a Glovo), e que parecem ter vindo alterar as regras (algumas legais) do mercado laboral e que tem associada uma enorme perda de direitos dos trabalhadores, nomeadamente em relação a salários, horários de trabalho, conciliação familiar, segurança e proteção social. Para tal, e de forma a solucionar este problema já se discute a necessidade de criar um enquadramento supranacional à escala europeia que atribua garantias mínimas universais para todos os trabalhadores de plataformas digitais e que incluam, nomeadamente, a definição de um salário adequado, limites de horário de trabalho e direito à negociação coletiva.
Pelas razões expostas, julga-se à semelhança do que fez com o Livro Verde Sobre o Mercado do Trabalho, o Governo deveria também promover a elaboração de um Livro Verde Sobre o Futuro do Trabalho.
Enquanto aguardamos pelo futuro, esperemos que a transformação digital seja uma oportunidade privilegiada de diminuir as assimetrias e desequilíbrios que hoje existem no mercado de trabalho, e não uma forma de ainda as tornar maiores, encontrando-se “o segredo da mudança não na luta contra o velho mas na construção do novo” (Sócrates).
Frederico Vidigal | Advogado na Macedo Vitorino & Associados
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